O TRABALHO INFANTIL COMO MANIFESTAÇÃO CULTURAL INDÍGENA E A ANTINOMIA ENTRE OS ARTIGOS 7º, XXXIII, E 231 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
Abstract
A Constituição da República proíbe trabalho para menores de 16 anos, exceto na condição de aprendiz, desde que a partir dos 14 anos (artigo 7º, XXXIII). Da mesma forma, a Carta Constitucional reconheceu aos indígenas sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições (artigo 231), o que é entendido como o reconhecimento constitucional do direito consuetudinário indígena. É certo que cada povo indígena concede à infância um significado distinto, da mesma forma que a idade em que o indivíduo é reconhecido como adulto varia de acordo com a comunidade. A despeito da diversidade cultural entre os povos indígenas, os estudos antropológicos evidenciam que, em geral, a criança indígena é dotada de notável autonomia, sendo desde cedo integrada à vida dos adultos, o que faz com que suas atividades rotineiras sejam parecidas com as dos mais velhos, inclusive em relação ao trabalho. Verifica-se, nessas situações, conflito entre artigo 7º, XXXIII, e o artigo 231, ambos da Constituição da República. Neste trabalho, através de pesquisa bibliográfica, elaborada a partir de obras já publicadas, tais como livros, artigos e publicações diversas, pretende-se analisar o conflito existente entre os referidos dispositivos constitucionais, objetivando-se encontrar solução que, do ponto de vista jurídico, seja adequada à solução da antinomia. Ao final, através de método dedutivo, será analisada criticamente, inclusive sob o ponto de vista antropológico, a questão do trabalho precoce fruto de manifestação cultural indígena.
References
BOLIVIA. Constitución Política del Estado 2009. Disponível em: https://www.minedu.gob.bo/index.php?option=com_content&view=article&id=1525:constitucion-politica-del-estado&catid=233&Itemid=933. Acesso em 13 abr 2023.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 22 jun 2022.
BRASIL. Decreto 5.051 de 19 de abril de 2004. Promulga a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e Tribais. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5051.htm. Acesso em 22 jun 2022.
BRASIL. Decreto 6.481 de 12 de junho de 2008. Regulamenta os artigos 3º, alínea “d”, e 4º da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação, aprovada pelo Decreto Legislativo no 178, de 14 de dezembro de 1999, e promulgada pelo Decreto no 3.597, de 12 de setembro de 2000, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/decreto/d6481.htm. Acesso em: 22 jun 2022.
BRASIL. Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 22 jun 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário n. 466.343, do Plenário do Supremo Tribunal Federal. Recorrente: Banco Bradesco S/A. Recorrido: Luciano Cardoso Santos. Relator: Ministro Cezar Peluso. Brasília, 3 de dezembro de 2008. Disponível em: http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/re466343.pdf. Acesso em: 27 jun 2022.
COHN, Clarice. Antropologia da criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico, 14ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
NASCIMENTO, Adir Casaro et. al.. A Cosmovisão e as representações das crianças Kaiowá e guarani: o antes e o depois da escolarização. In. Criança indígena: diversidade cultural, educação e representações sociais / Adir Casaro Nascimento (Org.). [et. al.]. Brasília: Liber Livro, 2011.
OIT, Brasil. Combatendo o trabalho infantil: Guia para educadores V1 / IPEC. Brasília: OIT, 2001. Disponível em: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---americas/---ro-lima/---ilo-brasilia/documents/publication/wcms_233633.pdf. Acesso em: 22 jun 2022.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção nº 138 sobre idade mínima de admissão ao emprego. Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho: Genebra (Suíça), 1973.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção n° 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais. Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho: Genebra (Suíça), 1989.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção nº 182 da OIT sobre Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação. Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho: Genebra (Suíça), 1999.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura. Paris (França): 2002.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais. Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura. Paris (França): 2005.
SCHADEN, Egon. Aspectos fundamentais da cultura guarani. São Paulo: E.P.U./EDUSP, 1974.
TASSINARI, Antonella. Concepções indígenas de infância no Brasil. Tellus, ano 7, n. 13, p. 11-25, out. 2007 Campo Grande – MS. Disponível em: http://www.gpec.ucdb.br/projetos/tellus/index.php/tellus/article/view/138/144. Acesso em: 22 jun 2022.
MARÉS, Carlos. Os povos indígenas e o direito brasileiro. In: Os direitos dos povos indígenas no Brasil: desafios no século XXI. Org: Carlos Frederico Marés de Souza Filho e Raul Cezar Bergold. Curitiba, Ed: Letra da Lei, 2013.
SOUZA Filho, Carlos Frederico Marés de. O Renascer dos Povos Indígenas para o Direito. Curitiba: Juruá Editora, 2012.
VILLARES, Luiz Fernando. Estado pluralista?: o reconhecimento da organização social e jurídica dos povos indígenas no Brasil. 2013. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-10012014-163451/pt-br.php. Acesso em: 22 jun. 2022.
WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo Jurídico: Síntese de uma nova cultura no Direito, 3ª ed. São Paulo: Alfa Omega, 2001.
Downloads
Published
Issue
Section
License
Declaro, para os devidos fins de direitos e obrigações, sob as penas previstas na legislação vigente, que como autor(a)/detentor(a) dos direitos autorais do artigo submetido, cedo-os à Revista Argumentum, nos termos da Lei Federal nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998 (Lei dos Direitos Autorais).